O Dia das Mães é no próximo domingo, dia 8 de maio, e as tradicionais manifestações estão por aí. Filhos publicam nas redes sociais aquela foto e uma linda mensagem; as mídias ficam cheias de propaganda; as lojas, mais movimentadas. Pequenos empreendedores oferecem produtos personalizados e guloseimas.
Para entrar no clima dessa data tão importante, nós aqui da Barkus, como bons educadores financeiros, resolvemos falar um pouco sobre as responsabilidades econômicas que as mães brasileiras têm assumido.
Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua) mais recente, em 2019, cerca de 48% dos chefes de família eram mulheres, ou seja, mais de 34 milhões de figuras femininas eram as responsáveis financeiras de seus lares.
Esse dado indica que as mulheres conquistaram uma maior independência financeira ao longo dos anos. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2021, elas representavam cerca de 42% da população empregada ー um número considerável, mas ainda desigual, se comparado aos demais 57% que eram homens. Além de estarem trabalhando e chefiando famílias, as mulheres também são as que mais administram as finanças da casa: 56% delas, segundo levantamento da Federação Brasileira de Bancos (Febraban).
E se nós olharmos esse cenário pelo viés da autonomia, ter o dinheiro administrado por mãos femininas, em uma sociedade tão patriarcal, é muito positivo. Mas de que quantia nós estamos falando? O que levou essas mulheres a assumirem as rédeas de seus lares?
Autonomia até a página dois — Um dos primeiros pontos de atenção nesse contexto é a desigualdade salarial: em 2019, enquanto os homens ganhavam, em média, R$ 2,5 mil, os rendimentos das mulheres ficavam apenas na casa dos R$ 2 mil ー ou seja, elas ganhavam cerca de 3/4 do salário deles, segundo o IBGE. Além disso, no mesmo ano, as famílias chefiadas por mulheres estavam concentradas nas faixas de baixa renda, com pouco mais da metade delas (53,4%) vivendo com até um salário mínimo por mês.
Cabe refletir sobre até que ponto vai essa autonomia financeira, uma vez que elas precisam fazer render uma baixa quantia de dinheiro
Até aqui, estavam incluídas nos dados tanto as famílias formadas por casais com filhos, em que a mulher está à frente do lar, quanto aquelas que contam com uma mãe enquanto única responsável pelos seus filhos. No entanto, é fundamental aprofundar as discussões sobre a situação das mais de 12 milhões de mães solo (com filhos de até 14 anos) do Brasil.
Recorte racial — Criar filhos, sem uma rede de apoio, no 9° país mais desigual do mundo, é uma tarefa árdua para todas as mulheres que se encontram nessa condição. Em tempos de pandemia, a situação é ainda mais grave. No entanto, é fundamental fazer um recorte racial nesse tema, uma vez que mais de 67% dessas mães são negras, segundo a Síntese de Indicadores Sociais do IBGE, publicada em 2021.
O mesmo estudo mostrou ainda que essas mulheres negras que cuidam de seus filhos, sem a ajuda do pai, concentram a maior incidência de pobreza: em 2020, quase 6 em cada 10 delas (57,9%) tinham um rendimento inferior a 5,50 dólares por dia (cerca de 28 reais por dia, na cotação de dezembro de 2020), ou seja, estavam abaixo da linha da pobreza.
Um outro cenário que foi piorado, principalmente pela pandemia, é o do desemprego: em meados de 2020, quase 8,5 milhões de mulheres deixaram o mercado de trabalho, segundo o IBGE. Mas a origem do problema é anterior à crise sanitária, uma vez que a taxa de desemprego entre as mulheres negras subiu de 14% para 15% entre 2019 e 2020, de acordo com levantamento do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Já a taxa das mulheres brancas variou de 9% para 12%, ou seja, a variação foi maior, mas elas continuam com um desemprego menor do que as mulheres negras.
Maternidade e crise econômica — Por todo esse prejuízo adicional gerado pela pandemia, as mães solo foram inseridas nos grupos que receberam o auxílio emergencial. Ao longo da crise, a ajuda variou entre R$ 600 e R$ 1,2 mil, teve idas e vindas, pagamentos parcelados e a cada 3 domicílios contemplados pelo auxílio, 2 eram chefiados por mães solo, segundo o IBGE. Já em 2022, foi aprovado, pelo Senado, o projeto de lei Direitos da Mãe Solo, que prevê o pagamento em dobro de benefícios, cotas mínimas de contratação em empresas, prioridade em creches, entre outras medidas. No momento, o projeto está em tramitação na Câmara dos Deputados.
O trabalho de cuidado é um outro aspecto intensificado pela pandemia, visto que metade das mulheres brasileiras passaram a cuidar de alguém durante a crise, segundo relatório da Gênero e Número. Além disso, 72% delas afirmaram que aumentou a necessidade de companhia e monitoramento das crianças, idosos ou pessoas com deficiência pelas quais elas são responsáveis. Cabe ressaltar que esse não é um cenário novo: lá em 2019, as mulheres negras já dedicavam 22 horas semanais aos afazeres domésticos e ao cuidado, e as brancas investiam 20 horas. Enquanto isso, os homens brancos gastavam apenas 16 horas nessas tarefas, de acordo com o IBGE.
Para além da crise sanitária, há também uma crise econômica que tem gerado todo o desemprego já mencionado, além de elevar a inflação para níveis que não são vistos há bastante tempo. A inflação de abril subiu 1,73% — a maior para esse mês desde 1995. Ela chegou a 12,03% no acumulado. Para as mulheres que são responsáveis pelas suas famílias, essa é mais uma preocupação a ser administrada: um estudo da Febraban indica que 8 a cada 10 entrevistadas acham que a inflação sobre os alimentos é o que mais tem impactado seus bolsos.
Com isso, imagina ter que conciliar o trabalho ou a procura por emprego, com os cuidados domésticos e com os filhos e ainda ter que administrar as finanças da casa, em tempos de crise e salários baixos? Tudo isso, com pouco acesso à educação financeira e, no caso das 12 milhões de mães solo brasileiras, sem o apoio do cônjuge. A reflexão que fica é: até que ponto essas mulheres escolheram chefiar seus lares?