Desde pequeno, o artista drag queen Allyster Fagundes demonstrava interesse por arte e performance. “Era criança e já tinha facilidade com as linguagens. Meus sentimentos eram expressos na escrita, em desenhos, ainda sem técnica”, diz. “Gostava de coisas femininas e pulava para pegar a saia de lambada estendida na corda na casa de minha tia para rodopiar na sala.”
Aos 33 anos, Allyster agora é pesquisador e ativista drag queen. Com seu trabalho na academia e no movimento, compartilha informação e desafia estereótipos.
DRAG Pessoa que se veste e se expressa de forma estilizada e exagerada no gênero feminino (drag queen) ou masculino (drag king). Por meio das performances artísticas e do humor, o objetivo é imitar, brincar, questionar e até desconstruir arquétipos de gênero. No Brasil, as cantoras Pabllo Vittar, Gloria Groove e Lia Clark são exemplos de drag queens famosas
Nascido no bairro da Sacramenta, periferia do Pará, Allyster viu os pais se separarem quando tinha 8 anos. Ainda na infância, teve depressão. Depois que o pai foi embora, o menino cresceu com a mãe, Dona Angela Maria, e seus três irmãos. A família agora vive no também periférico Telégrafo. Seus valores, diz o artista, foram construídos pelo bom relacionamento com a mãe. “Nunca precisei verbalizar que sou ‘gay’ pra ela, porque dizia de outras formas, como na forma como me portava, nas referências e nos discursos que trazia para dentro de casa.”
Mas foi na juventude, estudando teatro, que vieram as descobertas mais nítidas e a autoafirmação. Allyster conta que chegou a ter experiências heterossexuais, por causa da pressão social. “Existem vários preconceitos em casa, na escola, fica difícil se encontrar”, diz o artista. “Aos 20 anos é que entendo que sou um garoto gay. Acho tarde essa aceitação em relação a outros amigos LGBTQ+, mas cada pessoa tem o seu processo individual.”
Desconstruindo preconceitos — Allyster se aproximou da cena drag quando cursava jornalismo. Em 2016, seu trabalho de conclusão de curso foi uma pesquisa sobre o movimento na capital paraense. O TCC recebeu prêmios, seu autor participou de congressos de comunicação e, atualmente, faz mestrado em Artes na Universidade Federal do Pará (UFPA).
Quando se “monta” como drag queen, Allyster percebe reações de riso e espanto nas ruas do bairro. Mas a mãe “já chega e fala para as pessoas o que eu faço”. Ainda que tenha crescido recebendo apelidos, como “viadinho”, e olhares questionadores, o filho de Dona Angela Maria não lembra de episódios que o tenham desestabilizado por ser gay. “Na fase adulta, criamos um escudo. Não ligo para olhares, reprovações. É saber lidar com essas situações”, pondera.
Allyster acredita que o trabalho que desenvolve ajuda outras pessoas a se enxergar, apesar dos preconceitos. “A arte drag tem um papel social importante. É um corpo político, um corpo questionador. Quando entra uma drag queen em um espaço, algumas pessoas não vão gostar, outras vão se admirar, vão entender, e até se identificar.”
A arte drag tem um papel social importante. É um corpo político, um corpo questionador. Algumas pessoas não vão gostar, outras vão se admirar, entender e até se identificar
Considerado um exemplo para outros artistas da região amazônica, Allyster se diz feliz. Mas ressalta os obstáculos: muitos artistas são pobres e isso, junto com a desvalorização do trabalho artístico, torna muito difícil viver só da arte drag. Ele também acha que a sociedade ainda precisa evoluir no sentido de entender as pautas da comunidade LGBTQIA+ no País, principalmente em relação aos transexuais. “Existe uma hipocrisia muito grande quando a gente leva esse discurso para a rua. Quantas pessoas têm um amigo trans?”, pergunta.
A ARTE DRAG EM TRÊS TERMOS Montar: é se produzir (cabelo, maquiagem, roupas) Perfomance: apresentações coreografadas feitas em shows e boates Themônia: termo usado para se referir a drag queens da Amazônia que adotam um jeito bastante expressivo e particular de se montar, usando referências culturais e de comportamento que questionam padrões e bebem (também, e não só) no imaginário fantástico, na ancestralidade indígena e quilombola e em lendas da floresta. O termo surgiu quando artistas da região, principalmente periféricos, passaram a compor seu impressionante visual usando materiais básicos e acessíveis — como cola, papel e objetos recicláveis
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