Aos 26 anos, a carioca Thais Germânia de Assis de Campo, mais conhecida como DJ Germânia, define a música como uma ponte transformadora de sonhos em realidades. Quando sobe ao palco, a artista percebe naquele espaço uma extensão de si mesma. Ali, em frente aos equipamentos eletrônicos, ela busca se conectar ao público com o que há de melhor em si: o bom humor.
“No momento de iniciar uma setlist [lista com a ordem das músicas], me imagino dançando, se gostaria de ouvir em uma festa. A DJ Germânia é uma persona que não se desassocia da Thaís; uma pessoa divertida, alegre e que ama a sensação de estar viva”, diz. “Gosto sempre de ter essa perspectiva, de me imaginar parte da experiência da festa.”
Germânia é cria da favela Nova Holanda, no Complexo da Maré, e conhece o cotidiano periférico e negro. Hoje a sigla DJ está à frente de seu nome, mas antes a artista seguia na direção do mundo acadêmico, especificamente do curso de Direito, onde conheceu mais profundamente os mecanismos judiciais na questão racial.
“Podemos observar que, desde a abolição da escravatura até os dias atuais, houve poucos avanços no combate ao racismo institucional, tanto no Brasil como nos Estados Unidos. A aquisição de direitos civis não garantiu o tratamento igualitário entre negros e brancos […]”, diz Thais em Kendrick Lamar: o Medo do Homem Negro e o Poder Judiciário — o artigo, publicado por ela em 2018, reflete sobre os versos do rapper e os debates raciais nos Estados Unidos e no Brasil.
Não espere que a gente morra para virarmos uma hashtag, quero ser valorizada enquanto ainda posso aproveitar a oportunidade de ser a Germânia cheia de luz e vida
A boa repercussão do texto fez surgir convites para podcasts, trabalhos em audiovisual e redação, cursos etc.. “Costumo dizer que o ramo da música que me encontrou, na verdade”, diz a DJ. “Depois do reconhecimento do meu artigo, muitos projetos e iniciativas me convidaram para participar. Em 2019, ingressei no curso Urban Work The Responsa, onde tive o primeiro contato com o universo de DJ. De lá para cá, investi meu tempo total a isso, muita energia e dedicação para continuar me desenvolvendo como profissional e artista”, explica.
O trabalho tem rendido conquistas importantes na carreira da DJ Germânia, como a participação em diversos eventos. Ela já abriu shows de artistas conhecidos, a exemplo do rapper Djonga — que em 2020 foi o primeiro brasileiro indicado ao Bet Hip Hop Awards — e da dupla de MCs Tasha e Tracie, as irmãs gêmeas do Jardim Peri, periferia de São Paulo.
O “poder divino” da música — Para a DJ Germânia, essas realizações, em pouco tempo, vão além do que imaginava, mas casam perfeitamente com o ritmo acelerado que toca a sua vida. “Sequer imaginei me apresentar no Circo Voador [Casa de shows no Rio de Janeiro] neste ano. É uma das casas noturnas que mais admiro, mas é isso que mais me encanta na música, o poder de resgate e de marcar momentos. Através dela, ressurgi em 2018, quando enfrentei um período de depressão profunda. Agora, em 2021, a música tem me ajudado a lidar com o luto da perda da minha mãe. É um poder divino”, destaca.
Germânia avalia que o mercado musical é um cenário majoritariamente masculino e que esse fator afasta ou dificulta o talento feminino. Também afirma que a valorização de artistas periféricos merece mais destaque, porque a potência surge nas periferias: “É da favela, que nascem as pautas e os talentos mais comentados atualmente. Não espere que a gente morra para virarmos uma hashtag, quero ser valorizada enquanto ainda posso aproveitar a oportunidade de ser a Germânia cheia de luz e vida.”
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