A jornalista Mônica Costa é referência quando o assunto é o ensino de educação financeira a mulheres negras. Ganhadora do Prêmio ‘Educação Financeira Transforma’, do Instituto XP, e pós-graduada em Terapia Financeira e Gestão de Investimentos, Mônica desenvolve formações por meio do G&P Finanças, projeto autoral criado em 2019.
A iniciativa formou, nos últimos três anos, aproximadamente 1.000 mulheres no Brasil, na Colômbia, na Argentina e nos Estados Unidos, impactando donas de casa, mães solo, empreendedoras, estudantes e profissionais liberais, tendo como centralidade o empoderamento feminino e a realidade do racismo estrutural na sociedade.
O embrião do empreendimento surgiu a partir das vivências pessoais da educadora financeira. Na entrevista ao Expresso na Perifa, Mônica fala sobre parte dessa trajetória.
“Comecei a estudar educação financeira, entender sobre autoconhecimento e fiz cursos sobre história da África e filosofia africana. Percebi que esse era um lugar onde gostava de estar. O fato de ter me encontrado, de me entender melhor com minha ancestralidade, foram pontos positivos. Comecei a aplicar a educação financeira dentro do que estava aprendendo e percebi que havia um padrão entre nós, mulheres negras.”
A partir do G&P Finanças, Mônica oferece cursos, workshops e treinamentos voltados para a realidade dessas mulheres. Nas formações, os aspectos da ancestralidade e da autoestima são componentes centrais. O conhecimento ofertado abrange o ensino sobre investimentos, a negociação de dívidas e a precificação de produtos e serviços.
“A metodologia prevê que as mulheres passem por uma formação que traz questões da ancestralidade tendo como referência e base as ‘pretas de ganho’, mulheres escravizadas que iam trabalhar com seus tabuleiros nas praças das grandes cidades, especialmente na Bahia, no Rio de Janeiro, em São Paulo e em Minas Gerais”, explica.
Segundo Mônica, as ‘pretas de ganho’ usavam a educação financeira e entendiam que o empreendedorismo garantiria o alcance da alforria.
“Em uma sociedade injusta, precisavam trabalhar para resgatar suas liberdades. Quando trabalhavam dentro das casas – e faço até uma alusão de quando a gente trabalha dentro de uma empresa – existia [existe] uma figura que determinava [determina] até que ponto você poderia chegar, até quanto de renda poderia ganhar, o que foi realidade na minha vida”, fala.
O fato de as empresas limitarem os ganhos de seus funcionários, aponta Mônica, estabelece regras sobre “escolhas” e “liberdades”, já que a falta de renda impede avanços que vão desde a mudança de casa até a realização de um curso.
“Quando a gente empreende, temos mais possibilidades de fazer isso. Era o que as ‘pretas de ganho’ faziam quando levavam seus tabuleiros para as ruas. Tinham que devolver parte do que ganhavam aos seus exploradores, mas também podiam ficar com parte desse ganho. Nesse movimento, conseguem comprar a própria liberdade e de outros. As irmandades são ambientes onde conseguimos ver isso com facilidade”, detalha.
A escolha pela abordagem da historicidade e da ancestralidade, de acordo com a educadora, também impacta no aumento da autoestima.
“Quando a gente tem a autoestima elevada, temos maiores condições de fazer escolhas que nos tragam bem-estar. Isso está relacionado com dinheiro. Quando a gente vive numa sociedade em que somos desacreditadas e desmerecidas, crescemos com a crença de que a gente não merece mais do que isso, o que faz com que o dinheiro seja usado de forma inconsequente”, avalia.
Além de inúmeras parcerias, o projeto foi contemplado por alguns editais, algo que ampliou as formações para mulheres negras em cinco escolas de samba tradicionais de São Paulo.
“Depois dos cursos, ouço constantemente depoimentos dessas mulheres dizendo que se sentem mais capacitadas, usando o dinheiro como aliado na realização dos próprios sonhos. Se sentem mais poderosas, protagonistas, mais donas de sua própria história”, finaliza.