Todos os dias as mulheres enfrentam obstáculos pelo simples fato de serem mulheres. No esporte não é diferente
Julia Santiago é jornalista e integrante do coletivo Embarque no Direito
A prática de exercícios físicos por mulheres, no Brasil, é em média 40% inferior à dos homens. Outra informação do relatório sobre atividades esportivas do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) reforça as desigualdades: mulheres que ganham menos, se exercitam menos. Mulheres que ganham menos e são negras movimentam-se menos ainda. Os dados são de 2017, mas não parece ter havido mudança significativa.
A luta por equidade no esporte não é de hoje. A revista Trip fez em 2019 uma reportagem sob o título O boom do skate feminino. Uma passagem do texto contava: em 2005, as americanas Cara-Beth Burnside (skatista que ganhou três medalhas de ouro nos X Games, no vertical), Mimi Knoop (três medalhas de bronze nos X Games, também no vertical) e o treinador Drew Mearns fundaram a The Alliance, uma organização que representa skatistas mulheres de vários países, incluindo as brasileiras Karen Jonz e Ana Paula Negrão (skatista e fotógrafa de skate desde 1995). A Alliance desempenhou um papel fundamental para que homens e mulheres passassem a receber o mesmo prêmio nos X Games, a partir de 2008.
Karen Jonz, tetracampeã mundial de skate e comentarista olímpica do canal SportTV, escreveu para o Estadão sobre a estreia do esporte nos Jogos Olímpicos."Há três décadas, uma mina andando de skate era motivo de piada", diz. "Principalmente nos anos 90, a grande maioria das meninas que andavam era intimidada, criticada e desestimulada. Não tinha ambiente seguro. Não tinha essa de professor pra pegar na mão, pai que senta no banquinho para assistir o horário feminino. Criança (menina) não era bem-vinda em pico de skate. Era hostil. (...). Com os anos e as conquistas de cada geração, as barreiras foram sendo derrubadas e deixando tudo um pouco menos difícil. Não foi do dia pra noite." Leia a íntegra do artigo de Karen Jonz sobre skate nos Jogos Olímpicos
Ah! Repare que estamos falando especificamente do skate, modalidade que foi estreia nos Jogos Olímpicos de Tóquio. Na manhã de segunda-feira, 26 de julho de 2021, acordamos com um novo xodó: Rayssa Leal. Aos 13 anos e 203 dias, a maranhense levou a medalha de prata na categoria street do skate e tornou-se assim a atleta brasileira mais jovem a subir ao pódio olímpico em toda a história. Aproveitou para mandar um recado para aqueles que pensam que o skate é um esporte apenas para meninos: “Estamos nas Olimpíadas provando que o esporte não é só para eles. As meninas arrasam também”.
Esse marco me leva à reflexão: onde estão nossas meninas no skate? Quem incentiva garotinhas a praticar esportes, de modo geral? São muitos os fatores para que a ausência seja tão gritante, entre eles o cenário histórica e majoritariamente masculino. E a desigualdade salarial.
O mundo está em constante (re)evolução, mas ainda são muitos os paradigmas ultrapassados que precisam ser derrubados. No esporte, na vida. O skate, mesmo tendo evoluído bastante nesse sentido, ainda reproduz conceitos que não têm mais lugar na versão 2021 do nosso planeta. Nós, mulheres — filhas, irmãs, amigas, esposas, mães —, não valemos menos.
Rayssa, a fadinha do skate, inspira outras meninas e reconhece a importância do protagonismo feminino no esporte e na vida, de maneira geral. “Fico feliz em saber que inspiro outras garotas que querem ser skatistas. Isso é tão bom quanto subir no pódio. Todos, especialmente as meninas, devem fazer o que quiserem. Não se preocupe com discriminação, porque nós podemos ser o que queremos ser.”
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