Violência policial, evasão escolar de estudantes quilombolas, empregadas domésticas e mães solo. Ataques virtuais e racismo sofridos por profissionais da saúde em meio à crise sanitária. Todos esses problemas são tratados na websérie Pretas na Pandemia, dirigido pela jornalista Joyce Cursino e produzido pela da Negritar Filmes e Produções.
O programa, feito para ser exibido no Instagram — daí a captação das imagens na vertical — apresenta o cotidiano de cinco mulheres negras de Belém (PA) durante a pandemia da covid-19. Três dos cinco episódios já estão no ar no perfil Pretas Websérie.
A diretora Joyce Cursino conta que lida diariamente com dados sobre a pandemia e observou que as mulheres negras são um dos grupos mais afetados pela situação. “Não está todo mundo no mesmo barco”, afirma Joyce. “As negras estão, sim, na ponta da lança. Elas já não tinham acesso ao sistema de saúde antes da pandemia, elas cuidam das suas casas, das casas dos outros, estudam…são multitarefas.”
Para Mayara Coelho, uma das roteiristas de Pretas na Pandemia, retratar a realidade de inúmeras mulheres negras foi desafiador. “Foi uma produção complicada, principalmente na questão psicológica. Cada personagem tem um pouco de uma mulher preta das nossas vidas, minha mãe, a mãe de Joyce, tias e vizinhas.”
Emprego e renda — A websérie empregou cerca de 50 pessoas, sobretudo negras, negros e moradores das periferias de Belém. “Na verdade, são 50 famílias periféricas e quilombolas. Para nós, isso é muito gratificante”, diz Joyce.
Intérprete da personagem Maria Felipa, Rosilene Cordeiro chama atenção para a reflexão estimulada por Pretas na Pandemia. “Ela nos faz pensar onde estamos e o que queremos, sobretudo a população preta. É uma arte a serviço da vida, da sociedade e do povo preto”, afirma a atriz.
Por mais mulheres no audiovisual — Aicha Siqueira, diretora de som, fala da representatividade da mulher preta no audiovisual. “É uma área marcada pelo uso da força, a agilidade e o conhecimento e geralmente essas características [no senso comum] não são relacionadas à imagem da mulher, muito menos da preta”, diz. “Hoje eu aproveito desse processo de visibilidade profissional que estou vivenciando para dar oportunidade a outras mulheres pretas e o Pretas na Pandemia é uma forma de inserir essas mulheres no mercado cinematográfico.”
Aicha explica que a websérie foi feita em som direto. Ou seja, diálogos e ruídos foram captados junto as imagens — ao mesmo tempo. O objetivo é apresentar a periferia com a sonoplastia natural dos ambientes.
Filmagens na vertical — Pretas na Pandemia começou a ser produzido em 2020, mas o agravamento da crise sanitária suspendeu as atividades e o trabalho foi retomado em maio de 2021, com equipe reduzida e protocolos de segurança, afirma a diretora Joyce Cursino.
Segundo ela, a linguagem utilizada ajudou no processo e na segurança de elenco e demais integrantes da equipe. “Ligações e videochamadas já estavam presentes no dia a dia. Nas poucas interações entre as atrizes, elas foram testadas antes”, diz Joyce.
O formato vertical, até então inédito em produções locais, foi adotado para que o público experimente a sensação de estar em uma ligação de vídeo por meio de uma narrativa ficcional. “Foi complicado utilizar efeitos especiais com poucos recursos. Ainda tivemos muitos gastos com testes de equipe e elenco, pois não podíamos colocar ninguém em risco”, diz a diretora.