14 junho 2023 em Cultura
“Vida em coisas” apresenta instalações que exploram a relação entre a natureza e a tecnologia
É difícil passar incólume pela claraboia do Centro Cultural Banco do Brasil São Paulo, na Sé, projetada por Hippolyto Pujol (1880–1952). Todo artista ou curador que planeja uma exposição nesse espaço sabe que é melhor tê-la como aliada, em vez de tentar confrontar sua presença.
A dupla holandesa do Studio Drift, formada pelos artistas Lonneke Gordijn e Ralph Nauta, encontrou ali o espaço perfeito para a obra “Shylight”, que faz parte da exposição “Vida em coisas”, aberta ao público nesta quarta-feira (14/6). A instalação simula o desabrochar de flores com objetos feitos em seda que despencam, abrem e flutuam no vão livre em uma delicada coreografia.
“Parece que criamos a instalação especificamente para esse espaço”, comenta Gordijn. A feliz coincidência se deve ao diálogo do trabalho, criado entre 2006 e 2014, com elementos da natureza — as conchas dos gradis e flores do mosaico do piso — presentes na ornamentação do prédio do início do século XX.
A exposição inaugura ainda o anexo do CCBB-SP, que fica ao lado do prédio histórico. Embora o novo espaço não possua a mesma imponência arquitetônica da sede principal, ele se destaca por suas salas neutras e mais amplas, oferecendo maior flexibilidade para a montagem de exposições. Um alívio para a instituição conhecida por seus espaços expositivos estreitos.
“O anexo será um espaço multiúso. Além de mostras, vai abrigar outras atividades como dança, música e pequenos espetáculos de teatro”, explica Claudio Mattos, gerente geral do CCBB-SP. Com dois andares e uma área total de 300 m², o endereço vizinho amplia a capacidade expositiva da instituição para 1000 m².
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Quero receber!Movimento da natureza
Nesta nova área, há duas grandes obras da dupla holandesa. Logo no térreo, está “Amplitude”, que materializa os movimentos presentes na natureza, como o das ondas do mar e o do voo dos pássaros, com tubos transparentes que sobem e descem em perfeita sincronia. A escultura cinética “Ego”, inspirada na ópera “Orfeu”, do italiano Claudio Monteverdi (1567–1643), o cupa o primeiro andar. Um grande bloco feito de fios de nylon realiza uma dança que representa a oscilação de emoções e o dinamismo do pensamento humano.
“O movimento é a linguagem que fala ao coração. Basta apenas olhar, deixar entrar e sentir”, explica Gordijn. A coreografia lenta das obras permite que o espectador relaxe e se desconecte do frenesi do centro da cidade. “Shylight”, “Amplitude” e “Orfeu” preparam o visitante para a contemplação do restante da exposição no prédio histórico.
Cada um no seu quadrado
Do que é feito um Fusca, uma bicicleta ou um pandeiro? Na série “Materialism”, objetos do cotidiano passam por uma verdadeira autópsia, desvendando os elementos presentes em sua estrutura. Cada conjunto de materiais é compactado em blocos, criando relevos que visualmente apresentam a proporção de cada componente no objeto.
“Ao desmontarmos um Fusca de 1980, descobrimos que a maior parte de sua composição é feita de crina de cavalo e algodão. Ou seja, por dentro, ele é composto por materiais mais macios do que parece externamente”, explica a artista. Para a mostra no Brasil, são apresentados dois novos trabalhos, um que revela a composição de um chinelo Havaianas e outro que explora a estrutura de um pandeiro.
Os blocos retos são uma forma presente em diversos trabalhos da dupla — ponto de contrataste às formas orgânicas da natureza. Embora a inspiração dos artistas venha da fauna e da flora, não há nenhum interesse em falsificar qualquer aparência biológica ou enganar o espectador.
Todos as obras expõem e exploram esteticamente seus componentes tecnológicos vindos da indústria: plugs, fios de nylon, motores, tubos de vidro. Um dos pontos centrais do trabalho de Gordijn e Nauta é apresentar como essas máquinas conseguem reproduzir a beleza da natureza em seus movimentos ou em sua delicadeza.
A instalação “Futuro Frágil” apresenta bem essa simbiose entre meio-ambiente e tecnologia. Para criá-la, a dupla e sua equipe coletaram 15 mil sementes de dentes-de-leão durante a primavera em Amsterdã, na Holanda. Cada uma dessas delicadas hastes foi cuidadosamente fixada em uma luz de LED.
Essas pequenas luminárias estão conectadas a um circuito elétrico visível, formando uma estrutura retangular que ressalta a presença artificial dos componentes elétricos. “Com essa obra, mostramos como a natureza e a tecnologia podem conviver em harmonia”, conclui.
Serviço
CCBB-SP: R. Álvares Penteado, 112 — Centro Histórico.
Qua./seg.: 9h/20h.
Site: ccbb.com.br/sao-paulo. Grátis.
Karina Sérgio Gomes