Conheça Seu Hélio, o homem que criou o primeiro parque linear da cidade e transformou uma área que estava abandonada
Leia no Estadão a íntegra da reportagem do jornalista João Prata. Veja o vídeo nesta página
Botina sem meia, bermuda, camiseta, duas máscaras, óculos de grau e uma sacola de pano suja de terra pendurada no ombro. Seu Hélio está pronto para dar mais uma volta na floresta que ele mesmo plantou. E quando se diz floresta, não é força de expressão. São 33.136 árvores de 160 espécies em uma área de 3,8 quilômetros de extensão na região da Penha, zona leste de São Paulo. Um trabalho obsessivo realizado pelo gerente comercial Hélio da Silva, de 70 anos, que começou em 2003 e segue até hoje, devidamente reconhecido como primeiro parque linear da cidade.
Seu Hélio guarda na sacola uma folha de caderno preenchida frente e verso, rasurada, com o nome de cada uma das árvores e o saldo da plantação ano a ano. Dois álbuns abarrotados de fotos revelam a transformação de uma área abandonada em uma linha contínua verde que nem o drone lá do alto consegue registrar direito onde começa e onde termina.
- Hélio da Silva, o Seu Hélio, nasceu em Promissão, no interior de São Paulo. Vive na Penha desde 1958. Ele tem 70 anos
- Nos últimos dezoito anos, plantou 33.136 árvores de 160 espécies em uma área de 3,8 quilômetros da Avenida Carvalho Pinto, onde abandono às margens do poluído Rio Tiquatira sempre o incomodou
- Primeiro, comprou e plantou 200 mudas; uma turma não gostou e arrancou
- Seu Hélio voltou com 400 árvores. Jogaram fora novamente
- Ele resolveu plantar 5 mil. Chegou até a ser ameaçado por um comerciante que usava parte do lugar como estacionamento
- Moradores da região ficaram do lado de seu Hélio
- Usuários de drogas no descampado ajudaram a tomar conta das árvores
- O comerciante inimigo de árvore recuou. Seu Hélio avançou. Aos poucos a região se transformava
A única informação que ele não guarda em sua sacola é de quanto já gastou, ou melhor, investiu, com terra, adubo, ferramentas e mudas. Isso sem contar o dinheiro que distribui para o pessoal que fica de bobeira no parque. Em troca, Seu Hélio pede para ajudar na plantação.Em um ano, foram R$ 29 mil, em outro, R$ 32 mil, no início foi menos. Melhor não calcular essas coisas
Em um ano, foram R$ 29 mil, em outro, R$ 32 mil, no início foi menos. Melhor não calcular essas coisas [Seu Hélio, sobre quanto já investiu no parque linear]
- Seu Hélio não é botânico nem biólogo, mas criou critérios técnicos para reflorestar o local
- O conhecimento veio de pesquisar em casa e de sair por aí perguntando
As árvores do parque são distribuídas em linhas retas, acompanhando a margem do rio. Uma muda é plantada a cada cinco passos, em um buraco de 60 cm x 40 cm. Um pouco de terra fofa é colocada no fundo para as raízes se espalharem com maior facilidade. A botina pisa bem rente ao tronco para fixar melhor e evitar que o vento e a chuva derrubem a nova habitante. "A cada 12 mudas, obrigatoriamente, uma tem que ser frutífera. É regra, assim atrai os pássaros", diz Seu Hélio.
- O esforço começou a ser reconhecido oficialmente em 2007, quando o espaço recebeu o status de parque linear, o primeiro do município. Segundo seu Hélio:
- houve uma valorização dos imóveis em cerca de 30%
- a temperatura ficou mais amena. Do meio da avenida para a parte central do parque há uma diferença de 5 graus.
- as árvores trouxeram pássaros. Dezenas de espécies vivem ali
- o índice de criminalidade diminuiu, as pessoas começaram a praticar mais atividades físicas
Ouço cada história. Tem gente que me agradece toda vez e diz que o parque salvou sua vida. A pessoa andava depressiva, trancada em casa e agora vem aqui todo dia
De acordo com a organização do parque, circulam em média 700 pessoas por dia no local. O Plantador de Árvores, como Seu Hélio ficou conhecido na região, é parado o tempo inteiro para uma conversa. Alguém sempre aparece com novos planos para aquela área toda.
Seu Helio pretende manter a média de 3 mil árvores plantadas por ano. A pandemia dificulta, mas a cada ida ele planta ao menos uma. Durante a entrevista, entregou uma árvore ao repórter e outra para o fotógrafo. Em seguida, escolheu o lugar, ajudou a cavar e orientou para que nada fugisse ao protocolo. Então, tirou o celular da sacola, bateu uma foto e avisou: “Daqui uns anos vocês voltam e a gente faz outra para mostrar a diferença”.