Entre becos e vielas, ritmos e corpos se encontram diariamente nas periferias do Brasil, agregando ao que vem de fora a própria corporalidade
Negona Dance é dançarino, coreógrafo do Grupo Identidade e integrante do coletivo Lá da Favelinha
A arte sempre esteve muito presente nas realidades periféricas, principalmente a dança, como um espaço de debates e questionamentos. E o cotidiano das juventudes fortalece o aprimoramento técnico, pois os estilos mais ofertados na quebrada são os das danças urbanas, que em sua maioria vêm de guetos e subúrbios.
A dança se conecta com os jovens e leva a eles um olhar diferente do que já é imposto. No Brasil, temos diversos grupos que enxergam a dança como ferramenta e área de conhecimento para, a partir de vivências, pensar em outras possibilidades de futuro quando se trata da juventude.
Originado em meados de 2012 por meio de oficinas do Programa Fica Vivo, o Grupo Identidade, de Belo Horizonte (MG), é uma organização de danças afro-periféricas urbanas que usa a linguagem artística para gerar reflexões sobre direitos e política, bem como sobre a exclusão social a que sujeitos periféricos são submetidos, fomentando debates importantes e facilitando o acesso a cultura, educação e informação nas vilas e favelas da cidade. Só no Aglomerado da Serra, uma das maiores favelas do país, mais de 100 moradores foram alcançados.
Agora em uma fase mais madura, o Grupo Identidade tece seu currículo com produções próprias, a exemplo de coreografias e espetáculos, como o Black Bloc, que convida a refletir sobre os impactos e efeitos da profunda segregação social herdada do passado colonial escravocrata — e tal passado se reinventa para impedir que vozes e corpos periféricos ecoem para além dos muros (in)visíveis. Adotando a dimensão estética dos manifestantes black blocs, pretendemos denunciar nessa performance o silenciamento e a negação das questões da favela a partir da forma de manifestação que assumimos: a dança e a musicalidade afro-periférica.
Tiphany Gomes é uma das integrantes mais antigas do grupo e conta que a dança e a arte tiveram total influência em suas escolhas, na formação de seu caráter e de sua personalidade.
Comecei a dançar ainda na infância. Já na fase adulta, a dança me proporcionou vivenciar momentos incríveis e realizar sonhos que pareciam inalcançáveis. Além de me ensinar muito sobre como me portar, me posicionar e me relacionar, a dança também se tornou minha profissão. Hoje sou profissional na área, como dançarina e professora. Me orgulho imensamente por conseguir viver da dança
Para mergulharmos ainda mais na ideia de que a dança existe como ferramenta de transformação social, conversei com Bruna D’Carlo Ribeiro, mulher negra, mãe, doutoranda em Estudos do Lazer na Universidade Federal de Minas Gerais. Ela é mestra em Educação pela PUC-MG e Gestora do Projeto social Anjos D’Rua.
Para além de ferramenta, a dança se mostra como um caminho. Transforma, porque traz aos sujeitos visibilidade e emancipação, algo que o sistema falha com as juventudes. Com a dança as juventudes se descobrem potentes e abrem caminhos para sua transformação e irradiam para os seus. Se um sujeito passa a ter visibilidade, ele desloca a lente para todo o seu entorno. Levanta e leva os seus consigo. A transformação social pela dança é um caminho de solidariedade
Bruna nos diz, ainda, que a arte ajuda na construção do jovem periférico.
Especialmente no processo de construção identitária, o jovem encontra na dança um espaço para ser, sem medo, sem preconceito, sem rótulos. Ao ser acolhido pela comunidade, associa-se a pautas importantes e se forma nesse trajeto. Mobiliza e é mobilizado, transforma e é transformado. É convocado a ser no mundo
É nesse sentido que o Grupo Identidade continua com suas ações, resistindo para que os jovens não sejam apenas números nas estatísticas sociais. Conheça o grupo nas redes @grupoidentidade__
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