No dia 2 de dezembro, a Câmara Municipal de São Paulo aprovou em primeiro turno o Plano Plurianual (PPA) para o quadriênio 2022-2025. Mas Antenor Silva, de 65 anos, diz que nunca ouviu falar do PPA na cidade, ainda que tenha sido líder comunitário por décadas na Cidade Tiradentes, extremo leste da capital paulista. “Acontece que as periferias não são consideradas quando o governo quer fazer alguma coisa, né? Por exemplo, tem várias ruas aqui sem asfalto e sem saneamento básico”, afirma. “Agora, acha mesmo que é interesse deles que a gente participe das discussões e debate do orçamento?”
O QUE É O PLANO PLURIANUAL (PPA)?
O PPA é o planejamento central de um governo e determina a orientação estratégica e suas prioridades traduzidas em programas e ações. Está previsto na constituição para cidades, estados e para o País e funciona como um plano de metas.
Foi criado com o objetivo de trazer transparência à aplicação de recursos e aos resultados obtidos pela administração pública. A elaboração e apresentação do PPA à Câmara Municipal ocorre no primeiro ano de mandato do prefeito e a vigência vai do segundo ano até o primeiro da gestão seguinte.
De acordo com a Prefeitura de São Paulo, o PPA da cidade é elaborado com a participação de todos os órgãos da Administração Direta e Indireta, mas sem citar quais. Na ponta, pessoas como Antenor ainda reclamam participação na construção do documento, que neste ano não foi aprovado com consenso.
Críticas da oposição — No ato da aprovação, o líder do governo na Câmara, o vereador Fabio Riva (PSDB), ressaltou que o documento estabelece os programas, as ações, os valores e as metas para os próximos anos. Porém, o documento não agradou a todos. De acordo com a vereadora Elaine do Quilombo Periférico (Psol), apesar de alguns avanços, o Plano Plurianual 2022-2025 ainda “não atende às necessidades das pessoas mais pobres, das pessoas pretas, das pessoas que estão em locais mais periféricos.”Para a vereadora, as políticas estabelecidas não são suficientes e não atendem as pessoas mais pobres da cidade. A bancada do PT e o vereador Camilo Cristófaro (PSB) também registraram voto contra. “E ainda tem uns R$ 5 bilhões dentro desse Plano Plurianual que a gente não consegue identificar para onde vai”, emenda a vereadora.
Falta transparência — Para Antenor, a transparência na elaboração do PPA ainda não é completa, e as políticas públicas pensadas em prol dos munícipes deveriam ser mais horizontais. Segundo ele, poucas pessoas determinam ações e projetos que devem ser efetivados na cidade, sem participação popular.
O líder comunitário diz que a região onde vive abriga milhares de famílias que vivem nos conjuntos habitacionais, o maior da América Latina, sem contar com apoio público e com problemas sociais históricos, como educação de baixa qualidade, saúde pública precária e falta de opções de lazer. “Se fosse para sugerir coisas, quem melhor que eu e que a gente que vive e mora aqui há anos?”, emenda.
Em prol de uma discussão mais justa, Antenor sugere que secretários municipais e o prefeito visitem a região e outras periferias para entender as demandas ‘na rua’ e não somente com informações que chegam aos gabinetes. “Vem andar aqui e ver o que a gente precisa e o que pode ser importante no território, isso faz a diferença. A gente precisa ser incluído e não tem discussão”.
Do outro lado da cidade, em Grajaú, zona sul, vive a contabilista Rosângela Macedo, 47. Responsável por ações na região e ligada a movimentos sociais, afirma que já ouviu falar do Plano plurianual e que chegou a participar de algumas discussões, mas que os moradores das periferias ainda são minoria. “Sei disso porque estou muito ‘na cola”’, comenta.
A moradora da zona sul também diz que pode elencar prioridades que os governos não conseguem lidar, mas que há décadas impede que as pessoas dali não acessem direitos básicos, como o de ir e vir e de acessar serviços públicos de qualidade, como saúde e educação. “Vivo em São Paulo e como tal, deveria ser incluída em todos os debates que dizem respeito à minha presença aqui, mas nem sempre isso acontece”.
Os meses de pandemia foram prejudiciais à participação popular, diz Rosângela. “Se a gente não entrava nas salas de decisão, agora, com a internet ruim e com o perigo do vírus, isso piorou muito”, comenta. “A gente estava quase implorando para dar um palpite ou ajudar com uma opinião”, emenda.
Para os municípios, a entrega do projeto do PPA deve ocorrer até 30 de setembro do primeiro ano do mandato e são duas audiências públicas até a votação. Os trabalhos legislativos do ano não podem ser encerrados sem a aprovação do PPA. Na cidade, o PPA foi aprovado na Câmara Municipal, apesar de votos contrários de alguns vereadores e vereadoras. Com isso, o projeto se torna lei e passará a vigorar em 2022 no município.
No documento final, alguns itens são obrigatórios:
- Objetivo
- Órgão do Governo responsável pela execução do projeto
- Valor, prazo de conclusão
- Fontes de financiamento
- Indicador que represente a situação que o plano visa alterar
- Necessidade de bens e serviços para a correta efetivação do previsto
- Regionalização do plano e etc.
COMO PARTICIPAR DAS DECISÕES PÚBLICAS
O PPA é um plano que deve ser feito a cada quatro anos por todas as entidades da federação, governo federal, estados e municípios, para estabelecer diretrizes, metas e objetivos
- Ter em mente as prioridades
- Ficar atento às datas em que as discussões começam
- Acompanhar informações públicas de como e onde ocorrem as discussões e debates
- Sugerir pautas e itens que não podem deixar de entrar no documento final
- Levar em conta demandas mais urgentes e que há mais apelo popular
- Reunir dados e números que apoiem discursos e confirmem a situação relatada
Esta reportagem é uma produção do Programa Sala de Redação, realizado pela Énois - Laboratório de Jornalismo, do projeto Jornalismo & Território, com o apoio da Fundação Maria Cecília Souto Vidigal, Porticus e Open Society Foundation
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