O feminismo é uma das muitas lutas da humanidade por um mundo melhor. Mas o que é feminismo, por que é importante e, mesmo depois de tantas conquistas, por que seu conceito ainda é cercado de estereótipos ruins? A (des) igualdade social, econômica e política está entre as pautas mais importantes neste 8 de março, Dia Internacional da Mulher.
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O feminismo bateu recorde de popularidade no Brasil em 2018. As pesquisas na internet sobre o termo atingiram o ápice em outubro. Um levantamento feito pelo Estado com dados da plataforma Google Trends nos últimos dez anos mostra que o aumento nas buscas pela palavra feminismo foi de 30 em 2015 para 100 em outubro de 2018, em uma escala de 0 (nenhuma popularidade) a 100 (recorde de interesses). Os índices se referem aos números registrados pela plataforma do Google até 30 de novembro — como são dinâmicos, os dados podem apresentar diferenças após essa data.
Entre os principais termos relacionados ao feminismo pesquisados no Google estão: “significado”, “machismo” e “femismo” (palavra criada informalmente para indicar comportamentos extremistas de mulheres). Há ainda buscas por vertentes, a exemplo de interseccional, liberal e marxista.
“Eu uso o termo feminismos, no plural. Não existe um só, mas várias formas que têm mudado ao longo do tempo, dependendo da história, do país e da perspectiva”, diz Eva Alterman Blay, coordenadora do USP Mulheres. O levantamento também identificou um número alto de questões sobre as origens do movimento e também de pesquisas com caráter pejorativo, como “feminismo é mimimi” e “por que feministas não se depilam”. “Ainda há uma visão depreciativa muito forte, com uma tendência em aumentar agora, sobretudo com o medo de falar de gênero e com um temor ideológico que vem junto com o desconhecimento (sobre a causa)”, afirma Eva.
Para explicar a importância do feminismo de um jeito simples e bem claro, Chimamanda Ngozi Adichie transformou em livro uma palestra TED (Sejamos Todos Feministas; e-book grátis na Amazon) e a carta para uma amiga (Para Educar Crianças Feministas; R$ 4,95 o e-book)
O QUE É FEMINISMO?
Feminismo é movimento, teoria e prática na luta pela igualdade política, social e econômica para as mulheres. O conceito está na origem de muitas conquistas, como o direito ao voto (conquistas feitas à base de muita luta).
O QUE É MACHISMO?
Machismo é um comportamento opressor em relação às mulheres. O machismo nega à mulher prerrogativas ou direitos do homem.
FEMINISMO É O CONTRÁRIO DE MACHISMO?
Não. O machismo não reconhece e não respeita os direitos das mulheres e trata do que seria uma suposta superioridade masculina. O feminismo não defende a superioridade feminina, e sim a igualdade e o combate a injustiças – ele reconhece a importância dos direitos para homens e para mulheres. “Eu sempre digo que o contrário de machismo não é feminismo, e sim inteligência”, disse Mario Sergio Cortella, professor e filósofo, em entrevista à RedeTV.
POR QUE A CAUSA FEMINISTA É IMPORTANTE?
• Porque ainda tem gente que acha que feminismo é coisa de mulher infeliz que não consegue marido. Uma das vozes mais importantes na discussão de gênero da atualidade, a escritora nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie brinca em um de seus livros que, de tanto ouvir que “feminista odeia homem; feminista acha que as mulheres devem mandar nos homens; feminista não se pinta, não se depila, está sempre zangada, não tem senso de humor e não usa desodorante”, ela passou a se considerar uma “feminista feliz e africana que não odeia homens, e que gosta de usar batom e salto alto para si mesma, e não para os homens”.
• Porque combater injustiças é positivo e legítimo. Batalhar por direitos iguais para mulheres e homens ajuda a melhorar a vida, as relações e o futuro. Nesse sentido, os primeiros passos são reconhecer as desigualdades e buscar o equilíbrio.
• Porque a desigualdade de gênero existe e causa prejuízos sociais, para a relação entre as pessoas e perdas econômicas. Segundo o Banco Mundial, a desigualdade de gênero em rendimentos produz, globalmente, uma perda de mais de 23 mil dólares/ano por pessoa. “Pagar menos às mulheres gera menos dinheiro em circulação, faz com que se poupe menos, se consuma menos e, consequentemente, se pague menos impostos”, escrevem, em artigo sobre o tema para o site do Estadão, as especialistas em direito político e econômico Paula Zambelli Salgado Brasil e Mônica Sapucaia Machado.
• Porque a violência contra a mulher é um problema de todos. E mata. No Estado de São Paulo, uma mulher é vítima de feminicídio a cada 60 horas. Número de casos no ano passado é 12,9% maior que o registrado em 2017 e mais do que o dobro de 2016; especialistas afirmam que ainda há subnotificação.
• Porque é preciso criar meninos e meninas para que não achem a desigualdade natural.
As mulheres não precisam ser defendidas e reverenciadas; só precisam ser tratadas como seres humanos iguais (Chimamanda Ngozi Adichie, em Para Educar Crianças Feministas)
EXISTE UM JEITO CERTO DE SER FEMINISTA?
“Desde sempre, o feminismo é menosprezado e alvo de chacota”, escreve a jornalista Nana Soares, especializada em direitos da mulher e combate à violência. “Nós, feministas, somos taxadas de loucas destruidoras dos costumes, das famílias e dos homens. Gente da pior espécie. É tão feio socialmente que foi e continua sendo difícil que as meninas e mulheres se digam abertamente feministas, já que há uma série de expectativas e estereótipos em torno do rótulo. Como se fôssemos uma massa homogênea e que não se alterou ao longo do tempo.” Nana Soares faz três lembretes:
• Se você é feminista, você luta pela liberdade e pelo empoderamento de todas as mulheres. O seu feminismo não pode ser excludente e libertar apenas você. Enquanto houver uma mulher sofrendo violência de gênero, há motivo para lutar.
• Se você é feminista, você não pode desmerecer a luta de outras mulheres por ser diferente da sua.
• Se você é feminista, você tem que saber ouvir e reconhecer os seus privilégios.
HÁ MAIS DE UM FEMINISMO?
“Pela falta de representatividade no movimento ‘mainstream’ surgiu o feminismo negro, o transfeminismo, as feministas lésbicas e bissexuais. Há o feminismo interseccional, o radical, o movimento de mulheres trabalhadoras, o ecofeminismo. Dá para ser depilada, vaidosa e paciente. Dá para ter todos os pelos do corpo, e muita raiva. Dá para achar que não temos obrigação de reeducar os homens para desconstruir seu machismo, dá para achar que falar com eles faz parte do jogo. Todo mundo vai ter um jeito próprio de ser feminista”, escreve Nana.
POR QUE AFIRMAR O FEMINISMO É IMPORTANTE?
“O feminismo faz parte dos direitos humanos de uma forma geral — mas escolher uma expressão vaga como ‘direitos humanos’ é negar a especificidade e particularidade do problema de gênero. (…) Por séculos, os seres humanos eram divididos em dois grupos, um dos quais excluía e oprimia o outro. É no mínimo justo que a solução para esse problema esteja no reconhecimento desse fato.” (Chimamanda Ngozi Adichie em ‘Sejamos Todos Feministas’)
FONTES E MAIS INFORMAÇÕES: PLATAFORMA CAPITU, DA 29ª EDIÇÃO DO CURSO ESTADO DE JORNALISMO, O CURSO FOCAS (CAPITU TRATA DE POLÍTICA, COMPORTAMENTO E ECONOMIA DE FORMA MAIS LIGADA AO PÚBLICO FEMININO); BLOG DE NANA SOARES, JORNALISTA ESPECIALIZADA EM DIREITOS DA MULHER E NO COMBATE À VIOLÊNCIA. ELA FAZ MESTRADO EM GÊNERO E DESENVOLVIMENTO NA UNIVERSITY OF SUSSEX, NA INGLATERRA, E É CO-AUTORA DA CAMPANHA “VOCÊ NÃO ESTÁ SOZINHA” CONTRA O ABUSO SEXUAL NO METRÔ DE SÃO PAULO
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