Diretor da Biblioteca Nacional da Argentina fala sobre a importância da leitura na vida das pessoas. Sua intimidade com as palavras se revela em entrevista concedida por e-mail ao
jornalista Ubiratan Brasil, do Estadão.
QUEM É ALBERTO MANGUEL?
- Diretor da Biblioteca Nacional da Argentina, cargo já ocupado por Jorge Luis Borges, o argentino Alberto Manguel é dono de mais de 30 mil livros.
- Nasceu em Buenos Aires em 1948, viveu em Israel, no Taiti e em Toronto, onde se tornou cidadão canadense.
- Aprendeu a ler por volta dos 3 anos. Quando adolescente, leu em voz alta para Jorge Luis Borges, que ficara cego.
- Já morou em um presbitério construído no século 16 – ele comprou o lugar para instalar sua volumosa biblioteca.
- No livro de ensaios O Leitor Como Metáfora (Edições Sesc São Paulo), o autor convida à reflexão sobre a leitura e os leitores e mostra como ler é importante na vida das pessoas.
Que diria o senhor da seguinte frase de Hermann Hesse: “Os inimigos dos bons livros, e do bom gosto em geral, não são os que os desprezam, mas os que os devoram”?
Não concordo. Leitores geniais – Oscar Wilde, Ralph Waldo Emerson – liam velozmente, “devorando” o texto. O mau leitor não sabe entrar no texto, o que é muito diferente.
É melhor ler qualquer coisa que não ler nada?
O que significa esse “qualquer coisa”? O que é banal para um leitor pode ser essencial para outro.
Tolstoi considerava Rei Lear (de Shakespeare) má literatura. Nem todos são leitores. Há quem
não sinta prazer na leitura, em procurar o livro que foi escrito para ele, como há quem não goste
de mar e quem não tenha ouvido para música.
Nem todos são leitores. Há quem não não sinta prazer na leitura, em procurar o livro que foi escrito para ele, como há quem não goste de mar e quem não tenha ouvido para música
O público leitor está aumentando com o livro digital?
Não graças ao livro digital, mas está aumentando. Hoje, são vendidos mais livros que nunca, e são lidos no formato impresso e no digital. Mas talvez tenhamos chegado ao pico dessa tendência. As estatísticas mostram que a comunicação digital e audiovisual está substituindo, por exemplo, a
leitura de jornais e revistas. Talvez voltemos a nos comunicar pela palavra oral e por imagens, como na Idade Média.
Como leitor assíduo, o senhor se reconhece em certos personagens? Quais seriam? E já se apropriou de frases de certos livros?
Certamente. Eu me reconheço em Chapeuzinho Vermelho, em Alice, em Judas, o Obscuro, de
Hardy, em Brás Cubas… E todos os meus livros não passam de citações de outros: retocadas,
traduzidas, reescritas.
O que é mais importante passar para seus leitores?
Um prazer compartilhado.
Qual seria a importância da linguagem na obtenção de conhecimento e na satisfação da curiosidade?
Ela é absolutamente essencial. Todo conhecimento nos chega através dos sentidos (aí incluída
a intuição) e não podemos incorporá-lo realmente se não o transformarmos em palavras. Somos a
língua que falamos.