Por causa do cancelamento do carnaval de rua e adiamento dos desfiles, no Rio de Janeiro o prefeito Eduardo Paes relançou o Auxílio Ambulante Carnaval Carioca A ideia era oferecer uma resposta rápida aos trabalhadores camelôs que dependem da festa.
Os camelôs, porém, se queixam que o auxílio não alcança todo mundo e que o valor único de R$ 500 para o mês de fevereiro não é suficiente para sobreviver no Rio de Janeiro, principalmente até a nova data programada para a festa (abril).
Uma pesquisa da Federação das Associações de Ambulantes do Estado do Rio de Janeiro (Faeerj) mostra que os trabalhadores deixarão de faturar R$ 20 milhões. São aproximadamente 45 mil informais e mais de 10 mil cadastrados pela prefeitura. Eles movimentam, em média, R$ 500 por dia
Manifestação — No último dia 15 de fevereiro, camelôs do Rio se reuniram na Candelária para um protesto, reivindicando condições dignas e direito de trabalho nos comércios populares, fim da repressão da guarda municipal, isenção de taxas da Taxa de Uso de Área Pública (Tuap) de 2022 e o cadastramento dos trabalhadores para avaliação de melhorias para o Auxílio Ambulante Carnaval Carioca.
No protesto os ambulantes caminharam sob sol, calor e na movimentação dos carros na Avenida Presidente Vargas. Da Candelária até a prefeitura, os gritos de protesto eram: “Somos filhos da terra, ô seu prefeito, deixa a gente trabalhar!”. Por onde passaram, chamavam outros autônomos a participar. A manifestação foi acompanhada pela Polícia Militar e a Guarda Municipal.
Ao chegar, o grupo encontrou o prédio fechado. Vinte representantes do Movimento Unido dos Camelôs (Muca) puderam entrar. Na reunião, debateram partidos políticos e movimentos sociais em defesa dos trabalhadores informais, além do atual secretário de Ordem Pública, Breno Carnevale, e da Ouvidoria da Defensoria Pública. Sobre o auxílio carnaval, a responsabilidade foi atribuída ao prefeito Eduardo Paes. Levariam até ele as queixas do manifestantes.
Reunião — Durante mais de duas horas de reunião, os camelôs discutiram suas demandas por espaços dignos de trabalho e seus direitos, além da expansão e cadastro dos trabalhadores informais no sistema da prefeitura para o carnaval e o auxílio emergencial criado para a categoria.
À situação emergencial do carnaval e à infraestrutura adequada para os trabalhadores foi atribuída prioridade nas respostas. Para os espaços de comércio popular em Botafogo e Gardênia Azul, quinze dias. Também foi solicitada uma reunião com o prefeito Eduardo Paes.
Vozes — Durante a manifestação, o Expresso na Perifa ouviu trabalhadores que deram depoimentos sobre suas vidas e a continuidade da falta de diálogo com o poder público neste período.
Regina Célia dos Santos, 53, camelô desde os 12 anos, trabalha na Central do Brasil e começou a profissão acompanhando a mãe, que aos 77 anos ainda trabalha na rua. Regina sempre cuidou e sustentou sua família como camelô.
Por estar cadastrada no sistema da AMBEV, a trabalhadora vai receber o auxílio emergencial deste ano. “Vim para apoiar os outros trabalhadores que estão vivendo com dificuldade na pandemia e não receberam todo o auxílio emergencial [Programa do governo federal brasileiro de renda mínima aos mais pobres durante a pandemia de covid 19] até agora”, diz.
Regina vende salgadinhos em Benfica, zona norte da cidade. “O auxílio emergencial, no início, não consegui pegar. Só a primeira parcela no mês de junho de 2020. Quem ajudou a pagar meu aluguel foi a minha filha do meio, que hoje é enfermeira, e que consegui ajudar na formação dela trabalhando como camelô”, lembra.
Muitos trabalhadores não aceitam a forma como foi estabelecido o critério de seleção do Auxílio Ambulante Carnaval Carioca. Para Maria de Lourdes, 47, mais conhecida como Maria dos Camelôs, representante do Muca, “os ambulantes estão há dois anos sem trabalhar adequadamente. A pandemia atrapalhou muito o nosso trabalho e muitos estão com dificuldades para mercadorias e contas.”
Outros ambulantes também não concordam com o critério escolhido para liberar o auxílio: uma listagem da Ambev de 2020. “Muitos não estão inscritos e a cidade tem um número muito maior de trabalhadores ambulantes”, diz André Pacheco, 44, que desde os 24 anos está no centro da cidade. “O Eduardo Paes está usando a listagem de camelôs cadastrados na empresa Ambev no carnaval de 2020. Muitos de nós não receberam até o hoje o valor do auxílio implantado em 2021 por causa das dificuldades do acesso digital do pagamento.”
No dia 17 de fevereiro, quinta-feira, dois dias após a manifestação e reunião dos camelôs, o secretário Breno Carnevale descumpriu o acordo com os trabalhadores e ordenou que a guarda municipal removesse trabalhadores ambulantes, mesmo apresentando notas fiscais de suas mercadorias.
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