No último mês, diversas ações foram promovidas pelos garis junto a demais servidores e funcionários da prefeitura do Rio de Janeiro com o objetivo de protestar contra a falta de reajuste salarial.
Uma dessas associações que une a categoria é o Círculo Laranja, que recentemente mobilizou os trabalhadores em manifestações em prol da atualização anual dos pisos salariais, congelados desde 2007, além da mudança do plano de saúde, do reajuste do vale alimentação (congelado há 8 anos), do descongelamento de enquadramento de carreira e gratificações, de melhores condições de trabalho e contra a reforma da previdência do Rio.
Na pandemia, a situação dos trabalhadores ficou mais tensa com o governo municipal. “Os garis, trabalhadores de atividades essenciais, não podem paralisar seus serviços em meio à pandemia da Covid-19. Esses profissionais, todos os dias, enfrentam nas ruas os riscos da doença para que a população tenha uma cidade limpa com menor possibilidade de contrair o vírus”, disse o Siemaco-RJ (Sindicato dos empregados de empresas de asseio e conservação do município do Rio de Janeiro) em comunicado oficial.
Segundo a entidade, os trabalhadores da categoria enfrentam uma situação delicada, já que acabam sendo mais expostos ao vírus neste momento. Seja por estarem nas ruas ou por trabalharem diretamente com a coleta de lixo nos municípios.
Demanda urgente — Para Célio Viana, um dos fundadores do Círculo Laranja, a mudança do plano de saúde da Comlurb (Companhia Municipal de Limpeza Urbana) afetou os trabalhadores e, por causa da Covid-19, a pauta ficou ainda mais urgente. Ele diz que a alteração não foi comunicada e muito menos consultada. Essa é, no momento, a demanda mais importante da categoria, composta em sua maioria por moradores das periferias.
“A classe era atendida por um plano e de um dia para o outro mudou. Muitos garis filiados ao Círculo Laranja alegaram que as consultas marcadas e os tratamentos em andamento foram suspensos, e que estavam com dificuldade para agendar no novo plano”, diz. “Tem também a questão da co-participação. Agora o gari precisa pagar pela consulta e pelo tratamento. Como pode pagar? A classe ganha pouco e está com salário congelado há anos. Com o que ganha mal pode se alimentar”, questiona.
Fabiano Souza* trabalha na Comlurb há 10 anos. Ele é um dos 49.435 assistidos pelo plano de saúde contratado. Morador de Campo Grande, zona oeste do Rio, o gari reclama que a rede credenciada atual é pequena e o atendimento é ruim. Precisa se deslocar a bairros distantes para comparecer às consultas e realizar exames.
Fabiano conta, ainda, que o atendimento anterior era melhor e o plano contava com uma vasta rede, podendo ser atendido no próprio bairro. “Fui ao médico porque estava sentindo dores. Ele pediu uma ressonância de urgência no dia 26 de outubro, mas no atual só liberou o exame duas semanas depois. O exame foi marcado no dia 11 [novembro] e remarcado para dia 18. Só Deus sabe quando vou conseguir pegar meu exame e retornar ao médico”, conta.
Outra alegação de Fabiano é que ele e colegas estão sofrendo ameaças de exoneração e descontos no salário por relatar para a gerência os problemas causados pelo novo plano de saúde. “Fui prejudicado, falei dos meus problemas de ansiedade e depressão. Estou sentindo falta dos meus remédios. Conversei com meu gerente, que por conta das licenças médicas me encaminhou à sede da Comlurb para ser descontado no pagamento do próximo mês. Outro dia o assistente administrativo insinuou que poderia ser desligado da empresa por conta das licenças”, afirma.
Fui prejudicado, falei dos meus problemas de ansiedade e depressão. Estou sentindo falta dos meus remédios. Conversei com meu gerente, que por conta das licenças médicas me encaminhou à sede da Comlurb para ser descontado no pagamento do próximo mês. Outro dia o assistente administrativo insinuou que poderia ser desligado da empresa por conta das licenças
Fabiano Souza*, funcionário da Comlurb
Contratos suspeitos — Procurado pelo Círculo Laranja, o vereador Lindbergh Farias (PT) protocolou no dia 27 de outubro uma notícia-crime no Ministério Público do Rio de Janeiro contra a licitação. Segundo o documento, a Klini Planos de Saúde Ltda., atual plano adotado para a categoria, possui pouco mais de dois anos e mesmo sem expertise passou a operar contratos que somam R$ 239.743.319,09 com empresas públicas do município.
A denúncia também indica que há suspeita de favorecimento no edital, que permite a participação de empresas de médio ou de grande porte, sendo que a Klini está classificada como de pequeno porte. Dois garis foram exonerados por manifestarem contra a decisão.
Resposta da Comlurb — Questionada pela reportagem, a Comlurb disse desconhecer qualquer caso de ameaça a funcionários por expressarem insatisfação com seus superiores. Segundo a companhia, a migração para o Klini Saúde aconteceu de forma automática e que em nenhum momento ficaram sem cobertura de saúde e que tem recebido diversos depoimentos positivos sobre o atendimento e a rede credenciada.
*Nome fictício. A verdadeira identidade foi omitida para proteger a fonte