A olaria de Rosemiro Pereira, de 84 anos, fica no distrito de Icoaraci, a 17 quilômetros do centro de Belém (PA). Desde a década de 1960, o mestre ceramista e o amigo Antônio Freitas, o Cabeludo, transformam em objetos a argila extraída do leito dos rios. O espaço atrai estudantes e pesquisadores interessados na trajetória autodidata do artista. “Só tive a evoluir, porque não estudei. Sou mestre do notório saber e com isso tive a oportunidade de viajar o Brasil todo.” As peças da olaria também foram levadas a salões comerciais de artesanato em outros países, como Chile e Argentina.
A experiência de Rosemiro na cerâmica marajoara teve contribuições de outros oleiros. Ele, por sua vez, conta que ensinou o que aprendeu a familiares, amigos e comunidades. “Nas década de 1970 e 80, percorri vários colégios de Belém. Ajudei uma família com filhos pequenos, eles sempre me agradecem. O mais interessante é que todos hoje são oleiros e têm sua própria oficina”, conta.
Tradição familiar — A transmissão de conhecimento, técnica e habilidade em cerâmica movimenta o distrito de Icoaraci há muito tempo. É uma das expressões artísticas da região amazônica e um modo de ganhar a vida. “Nossa família toda cresceu nesse universo e a tradição já está na quarta geração”, diz a pedagoga e artesã Rosilene Trindade, de 43 anos, filha de Rosemiro. “No passado, fazíamos mais peças utilitárias, como potes, copos e pratos. Com a influência do oleiro Cabeludo, a cerâmica produzida na região ganhou um outro olhar e engrandeceu o trabalho feito ali.”
Em março de 2018, Rosilene recebeu o diploma de mestre ceramista e a Carteira Nacional de Artesão, ao lado do pai e do irmão, pela Secretaria de Assistência Social, Trabalho, Emprego e Renda do Pará. “É um reconhecimento para a gente, mas o papai já é chamado, há muitos anos, de mestre”, lembra. “Isso pra mim foi um momento histórico estando ao lado dele. A gente não se intitula assim porque somos daquele tempo que os mestres dos saberes eram mais antigos. Têm uma vivência maior dentro desse saber”, conta.
De janeiro a novembro de 2021 foram cadastrados 460 artesãos no sistema de informações do artesanato brasileiro, vinculado ao governo federal. Os dados são da Seaster
Outros ceramistas — O artesão José Luiz Nunes, de 53 anos, trabalha com arte em cerâmica há mais de três décadas. Na família dele, o ofício também é seguido pelo irmão e o sobrinho. “Vivo da renda do artesanato, criei meus dois filhos, comprei minha casa e todo meu sustento vem desse trabalho. Todo artista não pode parar. Enquanto Deus nos permitir vamos usar esse dom para criar e levar em frente a nossa arte.”
Roberto Navegantes, de 59 anos, faz parte da terceira geração de ceramistas de sua família e domina todo o processo criativo: da coleta da argila ao produto final. Ele conta que o comércio na feira do artesanato do bairro chegam a render R$ 1 mil ao mês, mas desde o começo da pandemia as vendas caíram. “Dependemos do turismo. Sem isso, a produção não é mais como antes e houve uma desvalorização do nosso trabalho. Várias famílias que vivem da arte em cerâmica foram afetadas”, afirma. “O que aliviou em quatros meses de feira fechada foi o auxílio emergencial que recebi.”
Mais sobre a tradição da cerâmica em Icoaraci Desde o início do século 20, a cerâmica está no cotidiano da população de Icoaraci, na periferia de Belém. O trabalho tem origem na persistência de uma atividade milenar desenvolvida principalmente por povos marajoaras e tapajônicos. Com o passar dos anos, a criação e a escultura das peças ganhou novos formatos, cores, grafismos e técnicas transmitidas por gerações. O trabalho manual, peça a peça, começa na obtenção da argila e passa por limpeza de impurezas, modelagem, forno, secagem e pintura. Assim são feitos pratos, copos, vasos, louças e outros utilitários e peças decorativas.
Fico feliz de ver essas matérias publicadas falando sobre o artesanato de Icoaraci, fez parte também da minha infância, inclusive aprendi a cavar e gravar na época a arte marajoara justamente na cerâmica do seu Rosemiro, não dei continuidade por que viajei e na volta fui trabalhar com meus tios com o comércio varejista e depois que casei fui ter o meu próprio estabelecimento comercial… Mas nunca deixei de apoiar o trabalho desses artesãos, na realidade é a nossa maior riqueza, só falta o reconhecimento das autoridades…