Em São Paulo, somente 18,1% da população da cidade mora a uma distância de até um quilômetro de alguma estação de trem, metrô ou monotrilho. O bairro mais bem atendido é a República (88%), mas, por outro lado, em 29 dos 96 distritos da cidade esse número é zero. Os bairros de Jardim Ângela, na zona sul, e Cidade Tiradentes, na zona leste, estão entre os 10 mais populosos da cidade, e não contam com nenhum tipo de transporte sobre trilhos.
Esses números estão na edição mais recente do Mapa da Desigualdade, lançado pela Rede Nossa São Paulo no dia 22 de outubro. Um dos pontos fundamentais do estudo se apresenta ano após ano: a desigualdade de acesso ao transporte público de qualidade.
Igor Pantoja, assessor de mobilização da Rede Nossa São Paulo, diz que o problema não é concentrado e atinge bairros de periferia nas zonas leste, oeste, sul e norte. “A cidade como um todo deveria ter um tempo médio de deslocamento muito mais razoável do que atualmente. A gente tem regiões que gastam muito mais tempo do que outras, principalmente os extremos das periferias, e a maioria são áreas bastante populosas”, diz.
Deslocamento para o trabalho é sempre maior — Um dos grandes problemas da defasagem na rede pública de transportes é o alto tempo de deslocamento até o trabalho. Por depender de ônibus para chegar até alguma estação de metrô ou trem, muitos passam um longo tempo no trânsito por dia e precisam fazer várias baldeações.
A pesquisa Viver em São Paulo: Mobilidade Urbana, também publicada pela Rede Nossa São Paulo neste ano, mostra que, mesmo na pandemia, a média de deslocamento para usuários de ônibus em São Paulo foi de 1h56 em 2020.
“Existe essa questão do acesso ao transporte e, conjugada, a discussão sobre a distribuição dos empregos e das oportunidades”, afirma Pantoja. “O ideal seria que as pessoas pudessem ter mais coisas próximas a suas casas pra não precisar nem o estado ficar gastando bilhões em infraestrutura e nem as pessoas terem que se deslocar mais de 20, 30 quilômetros diariamente”, completa.
Maioria está deixando o carro na garagem — Ainda de acordo com a pesquisa de mobilidade da Rede Nossa São Paulo, há uma mudança no uso do carro particular na cidade. Em 2020, 63% dos entrevistados disseram que não estavam saindo de carro por causa da pandemia e somente 39% responderam que estavam usando mais o carro pelo mesmo motivo. Outros 15% afirmaram ter usado mais o transporte a pé.
Para muitas pessoas que vivem nos extremos da cidade, ter um carro próprio não é uma questão de luxo, mas de necessidade. Acontece que, com o preço da gasolina na cidade com média de R$ 5,95 o litro (de acordo com a Agência Nacional do Petróleo), muitas pessoas deixam o carro na garagem.
Reflexo na qualidade de vida — Uma das informações mais importantes do Mapa da Desigualdade fala de diferença entre a expectativa de vida entre a população da cidade. Enquanto no Alto de Pinheiros, zona oeste, uma pessoas vivem em média 80,9 anos, na Cidade Tiradentes, zona leste, a expectativa cai para 58,3 anos.
Pantoja acredita que pontos como a estrutura precária do transporte público podem ser considerados centrais para essa grande diferença. “Isso tudo é muito desgastante para a população. A gente acredita que o indicador da expectativa de vida ser tão mais baixo nas periferias tem esse fator contribuindo. O fato de ter que gastar ali três ou quatro horas por dia no transporte certamente tem um efeito físico sobre a saúde das pessoas”, avalia o especialista.
FALTA INTEGRAÇÃO MODAL PARA VALORIZAR A BICICLETA COMO MEIO DE TRANSPORTE Para Pantoja, a violência no trânsito e a falta de estrutura viária adequada [a exemplo de uma boa integração modal] afastam as pessoas do uso de bicicleta no dia a dia. "Existe o medo e a questão do terreno, que é muito irregular. E falta infraestrutura. Se a pessoa for utilizar a bicicleta e mais algum outro transporte, por exemplo, ela não vai ter onde deixar. Infelizmente isso ainda não é uma realidade para muita gente", aponta. Mais sobre bicicletas e outras formas de circular mobilidade ágil, saudável e inteligente Mobilidade ativa para chegar são e salvo e forte
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