Mostra organizada pelo Instituto Porvir celebra o trabalho de educadores em benefício da inclusão e do desenvolvimento social nas periferias
A Constituição Federal determina que a educação é um direito de todos, dever do Estado e da família e uma ferramenta fundamental para o desenvolvimento da cidadania. Mas para que a escola seja um espaço de fortalecimento da democracia, a professora de educação básica no Distrito Federal Gina Vieira Ponte sabe que novos tempos exigem novas abordagens nas relações entre mestres e alunos. Ao acompanhar postagens de seus alunos, ela encontrou uma autenticidade que não via nas salas de aula, onde, conforme destaca, parafraseando o educador Paulo Freire, meninos e meninas são submetidos a um modelo autoritário, colonial e bancário. Por outro lado, a professora percebeu que o conteúdo compartilhado pelos estudantes apresentava um modelo de mulher (por exemplo) que ela descreve como “desumanizado, hipersexualizado e objetificado”. Diante disso, Gina resolveu criar o projeto Mulheres Inspiradoras, vencedor de 15 prêmios, entre eles o 1º Prêmio Ibero-Americano de Educação em Direitos Humanos.
A iniciativa de Gina e outras dez ações inovadoras na área de educação estão presentes na exposição interativa Encontro com o Porvir – Trajetórias de Educadores que Transformam o Presente e Constroem o Futuro, aberta ao público até o dia 3 de fevereiro no Museu Catavento, região central de São Paulo.
A atividade é organizada pelo Porvir, uma entidade sem fins lucrativos responsável pela principal plataforma no País para divulgação de conteúdos sobre inovação na área de educação. O instituto foi criado em 2012 pelos jornalistas Gilberto Dimenstein (1956-2020) e Anna Penido com o objetivo de apresentar e compartilhar propostas capazes de garantir uma educação de qualidade mais inclusiva e adaptada às mudanças nas relações sociais.
O objetivo do Porvir, explica Tatiana Klix, diretora do instituto, é promover um debate sobre educação e inovação, tanto em relação às tecnologias empregadas, quanto às metodologias de ensino. “No início tentávamos descobrir o que era inovação, esse novo jeito de ensinar, quais tecnologias poderiam ser utilizadas e fomos entendendo que não precisávamos buscar modelos no exterior, já estavam acontecendo. Ao mesmo tempo em que os professores foram usando referências para mudar suas práticas”, diz.
Mulheres Inspiradoras propõem novas referências — O projeto Mulheres Inspiradoras nasceu com turmas do 9º ano do ensino fundamental da capital federal para superar os referenciais femininos estereotipados a partir da leitura de obras como Quarto de Despejo, da escritora Carolina de Jesus, e O Diário de Anne Frank. Em uma segunda etapa, os alunos estudaram biografias de mulheres importantes e, depois, entrevistaram personalidades femininas marcantes da família, como mães, avós e bisavós.
“Ajudamos os estudantes a pensar criticamente a própria realidade, entender porque há alta incidência de violência contra a mulher, compreender o que são masculinidades tóxicas e a importância de desconstruí-las, mas também fortalecer a aprendizagem”, afirma Gina. Para ela, o resultado supera a avaliação equivocada de que há uma falsa escolha entre ensinar os conteúdos ou formar para a cidadania. O reconhecimento pode ser avaliado também pela transformação da proposta em um programa presente em escolas públicas do Distrito Federal, Mato Grosso do Sul e de Moçambique.
Outros projetos em exposição no Museu Catavento — Entre as ações inovadoras lado a lado com o Mulheres, há aulas na floresta, contação de histórias do quilombo e robótica com sucata. O Caderno de Elogios, elaborado pela pedagoga Sandra Cristina Cassiano no Centro de Educação Integrada de Maracajaú, em Maxaranguape, no Rio Grande do Norte (RN), pretende melhorar a autoestima, o ambiente e o convívio na comunidade escolar a partir da prática da escrita que valorize colegas, professores e funcionários. “Começamos a perceber o impacto disso no avanço dos alunos na sala de aula, a partir de uma convivência mais harmoniosa nas escolas e com as famílias”, explica Sandra.
ESCOLA PÚBLICA NO BRASIL Segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad), de 2019, divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mais de 80% dos alunos do ensino fundamental e médio estudam na rede pública. Porém, 11 milhões de brasileiros acima de 15 anos são analfabetos e 52% da população com mais de 25 anos não concluiu o ensino básico.
PAPEL FUNDAMENTAL DOS PROFESSORES
Regiany Silva, gerente de produtos do instituto Porvir, espera que a exposição no Museu Catavento deixe aparente o papel fundamental dos professores em tempos de discussão sobre temas como o homeschooling, o ensino domiciliar. “Sem o professor como mediador da aprendizagem, não existe metodologia ou ferramenta que seja efetivamente eficaz no processo de aprendizagem porque a educação se dá também a partir do afeto entre as pessoas. A escola não é só um espaço do desenvolvimento das disciplinas, mas de diferentes competências que passa por âmbito cultural e social”, afirma.
Em 2018, o Supremo Tribunal Federal (STF) julgou que não há lei que regulamenta o modelo de educação, mas a Câmara dos Deputados aprovou em maio deste ano o Projeto de Lei 3262/19, que autoriza o formato de ensino para jovens da pré-escola, ensino fundamental e médio. A medida será submetida à análise do Senado e, caso não existam alterações, seguirá para sanção presidencial. Mais de 400 organizações assinaram um manifesto contrário à liberação por alegarem que a aprovação representa um risco à garantia da educação para todos e pode intensificar desigualdades sociais e educacionais.
Encontro com o Porvir: Trajetória de Educadores que Transformam o Presente e Constroem o Futuro
Quando: 8 de novembro a 3 de fevereiro
Onde: Museu Catavento
Endereço: Av. Mercúrio, s/n – Parque Dom Pedro II, São Paulo (SP)
Quanto: quarta a domingo a partir de R$ 15 (R$ 7,50 a meia-entrada); terça, grátis. Vendas no site (museucatavento.org.br) e na bilheteria. Professores, coordenadores e diretores, supervisores, quadro de apoio de escolas públicas (federais, estaduais ou municipais) e quadro da Secretaria da Educação do Estado de São Paulo não pagam. Crianças até 7 anos também têm acesso gratuito.