Os gastos de final de ano ainda ecoam nas faturas de cartão neste início de 2022. Boleto carregado e outras contas da temporada, como impostos e material escolar, levam muita gente ao desespero. Aí está o perigo: recorrer ao cheque especial — aquele crédito extra que o banco oferece na sua conta — e/ou pagar só uma parte do cartão de crédito, criando dívidas por vezes insustentáveis.
No Brasil, o cheque especial está entre os produtos de crédito mais caros oferecidos por bancos e outras instituições financeiras, com taxas de juros que podem passar de 300% ao ano sobre o valor contratado.
O crédito rotativo do cartão, que ocorre quando a pessoa faz um pagamento menor do que o valor total da fatura, jogando para o mês seguinte o saldo restante e os juros cobrados sobre essa operação, também tem elevadas taxas.
O jeito é pagar. Mas como? — Nas redes sociais, não faltam memes e postagens que buscam suavizar o susto com as contas no início do ano, evidenciado que a situação é comum. O bom humor, contudo, ainda não ajuda a liquidar a fatura. E para sair dessas dívidas, não há outra forma de resolver que não seja pagar.
Se conseguir fazer um crédito pessoal numa taxa, por exemplo, de 180% ao ano, já pagará menos juros do que os 300% do cheque especial
Quando a renda é curta e já está comprometida, é preciso fazer um planejamento e focar no objetivo de zerar essa dívida, orienta o economista Juan Pereira. “Se conseguir fazer um crédito pessoal numa taxa, por exemplo, de 180% ao ano, já pagará menos juros do que os 300% do cheque especial. Consulte sua agência bancária sobre essa troca de produtos, indo para um com taxas menores”, explica.
Na negociação, Pereira recomenda considerar (migrar para e fazer o empréstimo em) outra instituição financeira que ofereça juros menores para cobrir a dívida anterior. “Hoje você tem as fintechs [bancos digitais], que oferecem crédito a um preço melhor do que os bancos tradicionais”, sugere.
O cheque especial pode trazer uma ideia de que a renda aumentou. Na verdade, ele diminui seu poder de compra porque o valor dos juros é muito alto e, ao longo do tempo, compromete a renda. A melhor forma é usar o cheque especial somente em situações de extrema urgência e por um curto período de tempo, alerta o economista Juan Pereira
Nome sujo — Em todos os casos, as movimentações devem ser feitas para não ficar inadimplente e, ainda pior, acabar com o nome inscrito nos chamados birôs de crédito, as instituições que registram o histórico pagador de uma pessoa e que as empresas consultam antes de conceder novos créditos.
A Serasa, que atua na proteção ao crédito, alerta que, ainda que a negativação da dívida associada ao CPF possa levar meses desde o atraso no pagamento, a inadimplência dificulta diretamente o acesso ao crédito e desorganiza seriamente a vida financeira das famílias. No site www.serasa.com.br dá para consultar, gratuitamente, a situação do CPF.
USAR OU NÃO USAR, EIS A QUESTÃO
CHEQUE ESPECIAL
Só em último caso e por pouco tempo. A economista e pesquisadora Regiane Vieira Wochler diz que a principal questão quanto ao uso do cheque especial é quando a pessoa associa esse crédito como parte da renda mensal. “Muitas pessoas demoram para entender que estão com problemas no equilíbrio de suas contas e acabam nas garras do cheque especial fazendo uso do limite como complemento de renda, comprometendo sua cidadania financeira”, diz a especialista, também consultora-sócia da Reconomizar Consultoria em Planejamento Financeiro.
CARTÃO DE CRÉDITO
Em muitas situações e com boa organização, pode ser um aliado. O ideal é ter um limite que não ultrapasse a renda mensal e esteja dentro do que se pode pagar mês a mês.
Suponha que na hora da compra você tenha o valor à vista e o cartão. Para decidir qual usar, tente um desconto com o vendedor — os comerciantes pagam taxas de administração sempre passam o cartão na máquina e às vezes abatem o correspondente a esse valor no pagamento à vista. Se não for oferecida vantagem nesse sentido, vale fazer a compra no crédito. E guardar o dinheiro que tem em mãos. Uma recomendação do economista Juan Pereira nessas compras feitas a prazo é pegar o que tem em espécie e deixar em uma fintechs que remunere esse valor.
“Se eu tenho mil reais para compras, uso essa mesma quantia no cartão de crédito e aplico o dinheiro na conta com rendimento. No fim do mês, terei em média R$ 1.030,00 por conta dos juros que foram rendendo. Pago a fatura e fico com R$ 30,00. Se em cada mês isso for feito, ao final de um ano serão R$ 360 reais gerados pelo investimento”, explica o economista.
TARDE DEMAIS?
Para quem entrou em uma dívida rotativa do cartão de crédito, Pereira afirma que vale partir para uma negociação junto ao banco, buscando formas de quitar a fatura integral, sem deixar sobras para o próximo boleto. “Tente não cair na bola de neve, que é quando paga a fatura parcialmente. Busque a negociação e reduza brutalmente os gastos no mês seguinte ou se, ainda precisar consumir, é preferível que parcele a compra, prestando atenção nas condições para que seja algo que caiba no bolso quando somado a outras compras.”
NEGATIVO DO CARTÃO
Para a economista Regiane Vieira Wochler, o lado negativo do uso do cartão está na desconexão entre o momento da compra e o do pagamento, uma armadilha para pessoas que costumam tomar decisões financeiras sem o que ela chama de padrões de racionalidade. “Pessoas que compram por impulso são mais afetadas por anúncios de promoções e se rendem a compras sem planejamento, muitas vezes sem pensar na real necessidade daquele bem e no impacto desse consumo no orçamento mensal”, diz Regiane. “Isso pode levar ao estouro do cartão de crédito e a não conseguir pagar.”
Com planejamento, os sonhos se transformam em objetivos e saem do papel. Quando [sabemos] o que queremos e fazemos uso consciente do dinheiro, fica mais fácil evitar vieses comportamentais que nos levam a erros e abusos no uso do dinheiro e crédito
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